Superfaturamento com plantões e no pagamento de cirurgias e pequenos procedimentos à GMS



Controladoria-Geral da União - CGU

Secretaria Federal de Controle Interno

RELATÓRIO DE APURAÇÃO

Órgão: MINISTERIO DA SAUDE
Unidade Examinada: FUNDO MUNICIPAL DE SAUDE DE TEIXEIRA DE FREITAS
Município/UF: Salvador/Bahia
Ordem de Serviço: 202000079


Foram analisados os contratos efetuados com recursos do Fundo Nacional da Saúde (FNS) em face do Processo de Credenciamento nº CD 04/2017 da Secretária Municipal de Saúde (SMS) para prestação de serviços médicos especializados exclusivamente como plantonistas junto as Unidades de Saúde geridas pela SMS: Hospital Municipal de Teixeira de Freitas (HMTF), Unidade Municipal Materno Infantil (UMMI) e Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Os contratos resultantes foram executados nos anos de 2017 e 2018.

Os recursos federais em análise fazem parte do FNS do Bloco de Média e Alta Complexidade em Saúde, sendo transferidos para o município os montantes de R$ 47.636.937,42 em 2017 e R$ 47.057.338,78 em 2018.

Observa-se que esses recursos fazem parte do Orçamento Federal, Programa de Fortalecimento do Sistema Único de Saúde, dentro da classificação funcional programática 10.302.2015.8585 - Atenção à Saúde da População para Procedimentos em Média e Alta Complexidade, conforme Portaria de Consolidação nº 6 do Ministério da Saúde, de 28 de setembro de 2017. 

Para efeito de avaliação e definição da amostra para a análise, inicialmente foi utilizada uma curva ABC considerando todos os pagamentos que tiveram como origem o Credenciamento nº 004/2017. A partir dessa curva, selecionou-se as empresas situadas em até 30% do total acumulado dos pagamentos, resultando nas informações abaixo:


Tabela 1 – Curva ABC contratos – Credenciamento nº 04/2017.


Dessa amostra de gastos, durante os trabalhos de campo foram selecionados de forma mais detalhada os documentos de comprovação das três primeiras empresas da curva ABC.

Enquanto os pagamentos às empresas Cope Clínica de Operações Especiais Ltda – EPP e Neurocure Medicina Especializada – EPP se referem a sete profissionais médicos, sendo quatro vinculados à COPE e três vinculados à Neurocure, os pagamentos à GMS se referem a apenas um médico, contudo, ela é a segunda empresa com maior remuneração na amostra das dez selecionadas.


Ressalta-se, que as constatações aqui registradas se basearam nas avaliações do processo de contratação, entrevistas de servidores e prestadores de serviço do mesmo processo, contratos e aditivos e processos de pagamentos, além da verificação de informações do sistema de atendimento do município (SPDATA) e da análise de escalas de plantões, listas de atendimento, planilhas de valores da produção, relações de
cirurgias, fichas de admissão de pacientes, livros de registros diários de cirurgias, entre outros documentos relacionados aos contratos realizados por meio do Credenciamento 04/2017.

RESULTADOS DOS EXAMES


1. Irregularidades no processo de Chamamento Público para fins
de Credenciamento de pessoas físicas ou jurídicas para
prestação de serviços médicos especializados.


1.1 Processo de Inexigibilidade não trouxe a adequada justificativa para a contratação
por meio do instituto do Credenciamento.


Foi analisado o Processo de Credenciamento nº CD 04/2017 SMS cujo objeto foi o Chamamento Público de pessoas físicas ou jurídicas para prestação de serviços médicos especializados, exclusivamente como plantonistas junto as Unidades de Saúde geridas pela Secretaria Municipal de Saúde: Hospital Municipal de Teixeira de Freitas (HMTF), Unidade Municipal Materno Infantil (UMMI) e Unidade de Pronto Atendimento (UPA).

Como resultado da análise, constatou-se que tal processo de contratação não trouxe adequada justificativa que caracterizasse o enquadramento como inexigibilidade de acordo com a legislação e jurisprudência sobre o assunto.

Na Folha 6 do referido processo, o item 2 – Justificativa apenas afirma a inviabilidade da competição, sem trazer elementos fáticos que sustentassem a decisão. Observe-se, que na folha nº 26 do processo, o Parecer da Comissão de Média e Alta Complexidade do Conselho Municipal de Saúde, apresenta posição controversa a respeito do assunto, indicando não possuir opinião segura sobre a metodologia adotada e resultados possíveis, como se depreende da manifestação transcrita abaixo:

Diante das informações colhidas, essa comissão está convencida que o modelo proposto propõe estratégias para redução de custos e aumento da produção nas unidades, fato urgente e necessário para a manutenção dos convênios e otimização de uso da equipe técnica disponível. Porém, não estamos seguros quanto à manutenção da qualidade do serviço que será ofertado à população mediante a redução significativa dos custos e a implantação do sistema de pagamento por taxa única para os vários níveis e classes de procedimentos cirúrgicos existentes nas diversas especialidades. Cientes da urgência da situação e visando não comprometer o atendimento à população aprovamos a proposta de credenciamento Nº 04/17, com o compromisso da gestão de até o mês de novembro apresentar, em tempo hábil, para apreciação do Conselho, uma proposta mais elaborada, com estratégias visando à ampliação não somente quantitativa, mas qualitativa dos serviços ofertados a população nas respectivas unidades.  

 

Apesar dos questionamentos do Conselho por meio da Comissão de Média e Alta Complexidade, não houve a inclusão no processo da adequada resposta às considerações incluídas no referido Parecer.

Assim, ao responder à Solicitação de Fiscalização nº 04 da CGU que questionou esse fato, o município não apresentou comprovação de ações para elidir as ausências apontadas pela Comissão.


Diante disso, considerando que no parecer incluído no processo a Comissão deu prosseguimento apenas para não prejudicar a população naquele momento, verificou-se que não houve no processo nem foram disponibilizadas/efetivadas pelo gestor evidências de garantias das condições preliminares necessárias antes da efetivação da inexigibilidade (credenciamento) para complementação dos serviços de saúde no
município, conforme Manual de Orientações para Contratação de Serviços de Saúde – 2017 do Ministério da Saúde.

Observa-se que, para esse tipo de contratação, o manual orienta para a necessidade de diversas ações para a justificativa do início do próprio processo de Credenciamento por meio de inexigibilidade, tais como: Implementar medidas de ampliação por meio próprio serviço público e restando a demanda, partir para a complementação que, inicialmente, deverá ser feita por entidades filantrópicas ou sem fins lucrativos, observando a preferência destas.


A licitação por meio de concorrência deve ser a regra e, somente se houver a demanda e a possibilidade de contratação de todo o mercado, se pode caracterizar também a utilização de credenciamento. Essas orientações encontram respaldo constitucional nos art. 199, parágrafo 1º e art. 37, inciso XXI e interpretação do art. 25 da Lei nº 8666/1993.

Nessa mesma linha de avaliação, para dar seguimento a um credenciamento/inexigibilidade, conforme previsto no artigo 26 da Lei nº 8666/1993, o processo deve ser devidamente justificado, é o que se depreende dos seguintes enunciados de decisões do TCU:

Acórdão nº 352/2016 - Plenário (Auditoria, Relator Ministro Benjamin
Zymler) Licitação. Inexigibilidade de licitação. Credenciamento. SUS.
Prestação de serviço

O credenciamento pode ser utilizado para a contratação de profissionais de saúde, tanto para atuarem em unidades públicas de saúde quanto em seus próprios consultórios e clínicas, quando se verifica a inviabilidade de competição para preenchimento das vagas, bem como quando a demanda pelos serviços é superior à oferta e é possível a contratação de todos os interessados, devendo a distribuição dos serviços entre os interessados se dar de forma objetiva e impessoal.


A celebração de ajustes com entidades privadas para disponibilização de profissionais de saúde deve ser precedida de estudos que demonstrem as suas vantagens em relação à contratação dos profissionais pelo próprio ente público, contendo planilha detalhada com a estimativa de custos a serem
incorridos na execução dos ajustes, além de consulta ao respectivo Conselho de Saúde.

Acórdão nº 768/2013 - Plenário

A despeito da ausência de expressa previsão legal do credenciamento dentre os casos de inexigibilidade de licitação previstos na Lei 8.666/1993, nada impede que a instituição contratante lance mão de tal procedimento e efetue a contratação direta entre diversos fornecedores previamente cadastrados
que satisfaçam os requisitos estabelecidos pela Administração. Para tanto, deve-se demonstrar, fundamentalmente, a inviabilidade de competição, a justificativa do preço e a igualdade de oportunidade a todos os que tiverem interesse em fornecer o bem ou serviço desejados.

Tais entendimentos também são observados no Parecer da AGU n° 07/2013/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU, transcrito abaixo.

13. A fim de prezar pelos aspectos essenciais do credenciamento, de modo a não o desnaturar nem o utilizar de forma indevida, é importante atentar para algumas diretrizes, abaixo apresentadas, cuja aplicação dependerá do caso concreto:


a. haja possibilidade de contratação de quaisquer dos interessados que
satisfaçam às condições exigidas;


b. o preço de mercado seja razoavelmente uniforme e que a fixação prévia de
valores seja mais vantajosa para a Administração, devendo ficar demonstrada
nos autos a vantagem ou igualdade dos valores definidos em relação aos
preços de mercado;


c. seja dada ampla divulgação, mediante aviso publicado no Diário Oficial da
União e em jornal de grande circulação local, sem prejuízo do uso adicional
de outros meios que se revelem mais adequados ao caso;

d. sejam fixados os critérios e exigências mínimas para que os interessados
possam credenciar-se;


e. seja fixada, de forma criteriosa, a tabela de preços que remunerará os
diversos itens de serviços;


f. sejam estabelecidas as hipóteses de descredenciamento;


g. seja prevista a possibilidade de denúncia do ajuste, a qualquer tempo, pelo
credenciado, bastando notificar a Administração, com a antecedência fixada
no termo;


h. a possibilidade de credenciar-se fique aberta durante todo o período em
que a Administração precisar dos serviços, conforme fixado em Edital, cuja
minuta deve ser analisada pela respectiva assessoria jurídica;


i. a possibilidade de os usuários ou administrados denunciarem qualquer
irregularidade verificada na prestação dos serviços;


j. sejam fixados critérios objetivos de distribuição da demanda, por exemplo,
sorteio público, excluindo-se os sorteados anteriormente, escolha pelo
próprio usuário-interessado etc.

Pelos argumentos pontuados, conclui-se que o processo de inexigibilidade não trouxe a adequada justificativa para a contratação por meio do instituto do Credenciamento.

1.2 Diferenciação indevida entre pessoas físicas e jurídicas, afetando o princípio da
igualdade para Credenciamento.

Na análise do edital, verificou-se a inserção de cláusulas com disposições que implicam diferenciação indevida entre pessoas físicas e jurídicas, no que concerne ao item de exigência de comprovação de capacitação técnica específica para os profissionais da PF, os quais deveriam apresentar Certificado de “Conclusão de Residência” na área pretendida.


Observa-se que tal exigência não ocorreu de forma igual, explicitamente, para os credenciados Pessoa Jurídica, configurando uma hipótese de favorecimento dessas em detrimento das Pessoas Físicas.

Ora, se não há óbice de natureza técnica e justificável para contratar Pessoas Físicas ou Jurídicas, as condições inseridas são impróprias e podem direcionar o resultado em afronta ao princípio da igualdade previsto no art. 3º da Lei 8666/1993.


Nesse aspecto, transcreve-se abaixo o Acórdão nº 141/2013 - Plenário, tratando desse tema que impossibilita a igualdade de condições para contratação de todo o mercado.

9.7. É de se presumir que a habilitação do profissional o qualifica a atender às necessidades do serviço, não sendo relevante perquirir diferenças técnicas entre os credenciados. Exatamente por isso, a etapa de avaliação é apenas eliminatória, e não classificatória (cf. Acórdão 408/2012-TCU-Plenário).


9.8. O profissional que preencher os critérios mínimos estabelecidos no edital será credenciado, devendo ser contratado em igualdade de condições com os demais que também lograram se credenciar. Vejam-se os termos do § 14 do voto que fundamenta o Acórdão 408/2012-TCU-Plenário:


O credenciamento se justifica exatamente em situações onde a contratação de todos os qualificados seja interessante (...). Todas as credenciadas devem estar em situação de igualdade, tendo as mesmas oportunidades de contratação.

Ou seja, tais disposições do edital vão contra a lei n.º 8666/1993 e o entendimento do TCU ao criar diferenças entre Pessoas Físicas e Jurídicas, desatendendo ao pressuposto principal do instituto do Credenciamento que é o de igualdade de condições para todos.

1.3 Não houve adoção de critérios e/ou metodologia de distribuição objetiva de
demandas entre os credenciados.

No que se refere à operacionalização do credenciamento, a jurisprudência aponta para a necessidade de regras e critérios objetivos de distribuição da demanda entre os credenciados, como condição para evitar favorecimentos e direcionamentos na distribuição da demanda nas contratações efetuadas.


No caso específico, não foi incluído no edital a sistemática de distribuição da demanda entre os credenciados e, apesar de requerido por meio de Solicitação de Auditoria, não foram apresentados documentos e informações que comprovassem essa metodologia.

A falta dessas regras e condições, de forma clara e transparente, expõe o processo de contratação à possibilidade de favorecimentos e impropriedades que frustram um dos pilares da caracterização do instituto do Credenciamento que é a possibilidade de contratar todo o mercado de forma impessoal e objetiva, princípios previstos no art. 3º da Lei 8666/1993.


Conforme se verifica nos julgados do TCU, há a necessidade de definição de tais regras de forma a possibilitar a contratação objetiva e impessoal:

Acórdão nº 352/2016 - Plenário


O Credenciamento pode ser utilizado para a contratação de profissionais de saúde, tanto para atuarem em unidades públicas de saúde quanto em seus próprios consultórios e clínicas, quando se verifica a inviabilidade de competição para preenchimento das vagas, bem como quando a demanda pelos serviços é superior à oferta e é possível a contratação de todos os interessados, devendo a distribuição dos serviços entre os interessados se dar de forma objetiva e impessoal.

Acórdão nº 5178/2013 - Primeira Câmara


A aplicação do sistema de credenciamento na contratação de serviços deve observar os seguintes requisitos, conforme as orientações expedidas pelo Acórdão 351/2010-Plenário: a) a contratação de todos os que tiverem interesse e que satisfaçam as condições fixadas pela Administração, não havendo relação de exclusão; b) a garantia da igualdade de condições entre todos os interessados hábeis a contratar com a Administração, pelo preço por ela definido; c) a demonstração inequívoca de que as necessidades da Administração somente poderão ser atendidas dessa forma, cabendo a devida observância das exigências do art. 26 da Lei 8.666/1993, principalmente no que concerne à justificativa de preços.

Portanto, a jurisprudência é no sentido de que devem ser garantidos critérios e/ou metodologia objetivos de distribuição da demanda.

2. Pagamentos por serviços não prestados, resultando em
superfaturamento de R$ 907.590,00.


Conforme análise da execução dos contratos do Credenciamento nº 04/2017, a Prefeitura de Teixeira de Freitas/BA pagou indevidamente à GMS, CNPJ 28.302.317/0001-00, o valor de R$ 907.590,00 por serviços profissionais de saúde não prestados no HMTF no período de outubro de 2017 a novembro de 2018, caracterizando-se como Superfaturamento, conforme demonstrado a seguir.

A referida empresa foi contratada por meio do Credenciamento nº 04/2017, que teve por objeto a contratação de pessoas físicas e/ou jurídicas para prestação de serviços médicos especializados exclusivamente como plantonistas junto às unidades de saúde geridas pela SMS: Hospital Municipal (HMTF), Unidade Municipal Materno Infantil (UMMI) e a unidade de pronto atendimento (UPA), conforme já mencionado no capítulo introdutório deste relatório.

Durante a vigência do contrato entre 2017 e 2018, a empresa recebeu o montante de R$ 1.243.220,00 por serviços médicos de plantões e cirurgias realizados, segundo os processos de pagamentos que compõem as evidências dessas constatações.


A GMS é formada por um único profissional médico, seguindo um costume do mercado, onde os prestadores de serviços individuais optam por usar uma pessoa jurídica ao invés de prestar os serviços como pessoa física, prática denominada “pejotização”, em função da menor incidência de tributos e encargos. Portanto, os serviços médicos prestados pela GMS foram todos executados por esse profissional.

O referido médico figura no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) da Receita Federal do Brasil (RFB) também como sócio administrador da empresa, informação confirmada pelos documentos da contratação e entrevistas durante a visita ao HMTF.


Embora processo de Credenciamento nº 04/2017 abrangesse três unidades de saúde do município, como destacado na introdução desse relatório, a proposta de adesão da GMS, conforme contrato nº 3-799-2017, previu o credenciamento da empresa para prestar serviços médicos unicamente para o HMTF.

A fim de aferir a regularidade dos pagamentos efetuados, buscou-se identificar a prática de levantamento da produção dos médicos, no período analisado.


A remuneração dos médicos da especialidade Cirurgia Geral que prestam serviços no HMTF é composta pela realização de plantões, pequenos procedimentos e cirurgias eletivas, sendo essas últimas realizadas em expedientes fora da escala de Plantonista do dia e de acordo com demanda do hospital e disponibilidade do respectivo médico.


Para contabilizar a produção dos médicos e plantonistas, o Hospital alimenta normalmente uma planilha relacionando os plantões por dia do mês, além das cirurgias eletivas e pequenos procedimentos de cada médico/empresa, discriminando detalhadamente os valores (Planilha de Produção Médica-PPM).

A Planilha de Produção Médica (PPM) é, portanto, um documento produzido pelo setor de faturamento do hospital para fins de remuneração dos profissionais médicos e suporte para elaboração dos processos de pagamentos relativos aos serviços médicos prestados pelas empresas no HMTF.


Tal detalhamento faz parte da rotina do setor de faturamento, sendo realizada para todos os médicos. No entanto, no caso da empresa GMS, observou-se que o levantamento da produção médica do profissional vinculado a ela foi realizado completamente a parte dos demais médicos, porém seguindo um padrão similar de
detalhamento.

A análise dos documentos, assim, permitiu fazer um levantamento razoavelmente preciso dos serviços e identificar os eventualmente não realizados. Ressalta-se que durante toda a vigência do contrato, esse detalhamento só não ocorreu nos meses de novembro e dezembro de 2017, tendo sido consolidado na rubrica genérica Produção.

O levantamento efetuado confirmou que os pagamentos à GMS, na sua totalidade, ocorreram em levantamento à parte, realizado por ele mesmo e/ou sua secretária, faturando-se Plantão e Cirurgias Eletivas.

A contraposição desse levantamento com os documentos de plantões e cirurgias do HMTF, demonstrou um superfaturamento em razão de plantões não realizados e, também, em face de valores a maior faturados em cirurgias eletivas e pequenos procedimentos, ora pelo uso indevido de tabela exclusiva de enquadramento das cirurgias eletivas e dos pequenos procedimentos (não aplicada aos demais profissionais e sem base contratual), ora pela inserção desses serviços na produção do médico sem a devida realização.

Conforme se verificou, considerando as análises realizadas, conclui-se que as faturas apresentadas pela GMS se tratava de uma “conta de chegada”, para atingir o montante acordado, como se referiu um dos entrevistados em relação aos pagamentos realizados ao profissional médico.

Em verdade, o contrato de adesão firmado já apresentava sinais de superfaturamento na sua origem. Nos itens do Credenciamento CD nº 04/2017 (Chamamento Público) em que a GMS apresentou sua proposta para prestação dos serviços médicos, ela fez uma oferta 28% superior às quantidades demandadas pelo ente público. O que exigiria de sua parte, para plena execução do contrato, dado o volume de serviços ofertados, mais de um médico vinculado ao seu CNPJ.

Observa-se que a GMS era constituída de apenas um médico, conforme já observado, e assim continuou durante toda vigência da execução do contrato, sendo suas faturas realizadas com o vínculo desse único médico. Situação que torna sua proposta, mesmo nas condições originais, sem os 28% adicionais, completamente inexequível, por apresentar um volume de trabalho impossível de ser realizado por um único profissional, considerando os valores mensais contratados.

De fato, o que resultou da análise da execução do contrato foi um volume de prestação de serviços bastante inferior aos serviços faturados em seus processos de pagamentos, constituindo-se, assim, os pagamentos nos volumes executados em superfaturamento durante toda a vigência contratual, conforme será demonstrado de forma mais detalhada a seguir.

Para melhor entendimento dos valores envolvidos no superfaturamento dos serviços médicos não realizados, ele foi dividido em superfaturamento por plantões não realizados (R$ 485.640,00) e superfaturamento em cirurgias eletivas (R$ 421.950,00), que somados totalizam R$ 907.590,00.

2.1 Superfaturamento por Plantões não realizados gera pagamento indevido de R$485.640,00.

Durante trabalho de campo, foram entrevistados diversos profissionais do hospital que atuaram no período sob análise, inclusive de outras especialidades, a respeito da presença do profissional médico vinculado ao CNPJ da empresa GMS nos plantões da  sua especialidade (Cirurgia Geral). As respostas ao questionamento revelaram que ele nunca deu plantão no HMTF durante o período em que esses profissionais entrevistados atuaram no hospital.

Por outro lado, exames realizados nas escalas de plantões do período sob análise, fornecidas pela direção do hospital, revelaram de fato que durante todo o período de vigência do contrato da empresa GMS, o médico a ela vinculado nunca fez parte da escala de plantões e, assim, nunca realizou plantão em revezamento com os demais profissionais cirurgiões, corroborando a constatação feita nas entrevistas. 

O que se observou nas entrevistas foi que o médico M.F.A.S atuava por demanda e interesse pessoal em dias determinados da semana, quase em forma de mutirão, realizando desde pequenos procedimentos até procedimentos de médio porte, utilizando-se de sala exclusiva no hospital e com secretária particular para atendimento a pacientes exclusivamente destinados a ele. Na sua maioria, para realização de pequenos procedimentos como exéreses com uso de anestesia local, drenagem de hematomas e desbridamentos de ordem geral.

O controle dos procedimentos e das cirurgias efetuadas ficava sob exclusivo gerenciamento do próprio médico e de sua secretária, sendo faturado em planilha separada.

Tal forma de atuação, contrariou totalmente os termos estabelecidos no contrato, que estabeleceu jornada de trabalho por plantões e realização de cirurgias eletivas de acordo com as necessidades do Hospital.

Atuando dessa maneira, o hospital criava uma demanda própria para o médico em serviços e despesas sem previsão no contrato, deixando uma lacuna de plantões e cirurgias eletivas sem serem realizados, que acabava sendo coberto por outros profissionais médicos, deixando a empresa de atender os serviços previstos contratualmente e demandados pelo hospital.

Assim, não se podia contar com o referido profissional para os plantões, apesar de ele faturar a rubrica de plantões praticamente todos os meses do contrato. Portanto, todo valor pago e faturado na rubrica Plantão em nome da empresa caracteriza-se como indevido, alcançando um montante de R$ 485.640,00 relativos aos meses de janeiro a setembro de 2018.

A tabela a seguir, apresenta o detalhamento dos plantões não realizados nos meses
referenciados.

Tabela 2 - Superfaturamento por plantões não realizados.

Fonte: Escalas Médicas dos anos de 2017 e 2018, Planilha de Produção médica de janeiro a dezembro
de 2018. Entrevistas com Profissionais do HTMF.



2.2 Superfaturamento em cirurgias e pequenos procedimentos geram pagamento
indevido de  R$421.950,00.

Uma vez constatado que o médico não realizava plantões no hospital, conforme observado nos faturamentos de sua produção e nos contratos celebrados, buscou-se identificar qual era a rotina do profissional no hospital, a fim de avaliar a efetiva produção.

Foi verificado que sua atuação era voltada para realização de cirurgias eletivas e de pequenos procedimentos em dias determinados da semana como em forma de mutirão.

Segundo informações obtidas in loco, havia dias específicos que o médico M.F.A.S atendia no hospital, nos quais, geralmente, formavam-se filas de pacientes, o que indica que não eram pré-agendados e que bastava o paciente se dirigir ao hospital e indicar o médico da GMS para o procedimento.

Ocorre que as Cirurgias Eletivas de porte médio, com uso de anestesistas do hospital, são registradas no livro de registro diário do hospital, onde constam data do atendimento, médico ao qual o paciente foi direcionado, nome do paciente e tipo de procedimento a que o paciente foi submetido.

Já os Pequenos Procedimentos realizados pelo médico da GMS eram registrados na Ficha de Atendimento do hospital, sem registro no livro de registro diário.

Assim, para aferir a legitimidade dos pagamentos e dos atendimentos realizados, foi feito um cotejamento, por amostragem, dos meses de agosto e outubro de 2018 do livro e dos pacientes relacionados nas faturas daqueles meses, objetivando identificar se as cirurgias eletivas contabilizadas na Planilha de Produção Médica (PPM) tinham sustentação no Livro de Registro Diário do hospital.

O exame efetuado revelou que do total de pacientes com cirurgias eletivas de médio porte realizadas presentes nas PPM’s, apenas uma pequena parte constava do referido livro, evidenciando a inserção de cirurgias eletivas não realizadas nas faturas sem a devida contraprestação.

Enquanto o registro de cirurgias no Livro de Registro Diário apresentava oito cirurgias feitas pelo médico para o mês de agosto/2018 e duas para o mês de outubro/2018, a PPM registrou 226 cirurgias em cada um desses meses, sendo 131 de cirurgias eletivas I, 87 de eletivas II e oito eletivas oncológicas. Esses mesmos números de cirurgias foram registrados na PPM no mês de setembro.

A improbabilidade de se repetir o mesmo número de cirurgias por três meses seguidos é mais um elemento que aponta para falsos registros de produção e indevido faturamento.

Adicionalmente, como método de avaliação, foi feito um cotejamento dos pacientes presentes nos processos de pagamentos dos meses de agosto, setembro e novembro de 2018 com os registros de pacientes nas fichas de atendimento do hospital atribuídas ao médico da GMS nesses meses. O mês de outubro/2018 foi desconsiderado, pois não houve processo de pagamento correspondente.

O objetivo do procedimento foi identificar se os pacientes e os procedimentos relacionados tinham suporte nas fichas de atendimento e o resultado obtido demonstrou que a relação de pacientes atendidos por ele registrada nos processos de pagamentos da empresa é compatível com suas fichas de atendimento, tanto em quantidade, como em procedimento.

Contudo, não foram encontradas correspondências desses pacientes quando cruzado com o Livro de Registro Diário, evidenciando que se tratava de Pequenos Procedimentos e, portanto, pela sistemática adotada pelo hospital, desobrigados de registro no livro.

O valor de tabela de remuneração para Pequenos Procedimentos é R$ 60,00, mas como não foram encontrados registros de Pequenos Procedimentos na produção do referido médico, estes foram contabilizados nas Planilhas de Produção Médica como cirurgias eletivas mais complexas com valor variando entre R$ 300,00 e R$ 400,00 cada uma.

Essa foi a forma de o referido profissional ser remunerado por um valor já acertado (“conta de chegada”) muito acima dos demais médicos de sua especialidade, incluindo plantões não realizados nas planilhas de produção médica e fazendo uso de uma tabela exclusiva de enquadramento (não prevista em contrato) de preço em pequenos procedimentos, inflando o seu valor e contrariando os termos contratuais.

Em relação ao valor total recebido, chama a atenção também, que enquanto os demais médicos na especialidade Cirurgia Geral recebiam em torno de R$ 35.000,00 reais, o referido médico recebia mensalmente em torno de R$ 120.000,00 reais, algo impossível, com base na demanda, como foi mencionado inclusive pelos entrevistados.

Como era ele e sua secretária que controlavam a sua produção, cabendo ao setor de faturamento do hospital somente planilhar e enviar para pagamento, foi possível sua empresa com uso desse expediente e de possível conivência do HMTF receber indevidamente os valores faturados.

Para confirmar essas constatações, um outro levantamento feito a partir do SPDATA - sistema de gestão hospitalar adotado pela prefeitura - de maior fidelidade, pois cada procedimento registrado está associado a um profissional e ao número da AIH do  paciente, evidenciou as inconsistências na PPM do profissional citado, bem como reforça as irregularidades praticadas pela GMS.

Foram consolidados do SPDATA o número de procedimentos cirúrgicos de mais três médicos, selecionados aletoriamente entre os cirurgiões que atuaram no mesmo período do médico vinculado à Clínica GMS.

Esse levantamento teve por objetivo verificar se a média de atendimentos e de procedimentos cirúrgicos que cada um deles executou no período de novembro de 2017 a outubro de 2018 guardava proporcionalidade com a produção do médico da GMS.

O resultado da análise constatou que o cirurgião geral da GMS executou nesse período 829 procedimentos cirúrgicos contra 215, 230 e 217 dos outros três cirurgiões gerais. Revelando que houve uso exclusivo de equipamentos e espaços do HMTF e a criação de demandas por procedimentos exclusivos para o médico da GMS possibilitando-lhe executar uma quantidade superior em 357% comparada ao segundo médico com maior número de pacientes.

Como já dito, entrevistas com profissionais do HTMF revelaram que o médico da GMS tinha uma rotina definida no local com datas certas para atendimento, sala de uso exclusivo e até secretária própria para recepção e faturamento dos atendimentos.

Junto a essas constatações, entrevista do próprio médico ao site local de Jornalismo “Liberdade News”, em 9/11/2018, demonstra o direcionamento de procedimentos médicos para o médico e uso exclusivo das instalações hospitalares.

Além disso, outro levantamento do SPDATA, cotejado com os dados da Planilha de Produção Médica-PPM para os mesmos três médicos, porém dessa vez, considerando os meses de agosto a outubro de 2018, acrescentou mais um fator de gravidade: superfaturamento nas quantidades executadas de cirurgias eletivas.

Conforme registro na PPM, o médico da GMS (MED4), nesse período de três meses (ago, set, out), executou 678 cirurgias eletivas superando em 279% o número de procedimentos cirúrgicos registrado no SPDATA que foi de 243, além de ter realizado 240 plantões.

Para fins de comparação e constatação da significativa diferença em relação aos demais profissionais, o segundo médico da amostra que mais realizou cirurgias eletivas na PPM executou um total de 49 cirurgias eletivas contra um total de 93 procedimentos cirúrgicos registrados no SPDATA, ou seja, apenas 53 %. Além de 57 plantões. Nenhum dos dois tem registro na PPM de execução de Pequenos Procedimento-PP.

Cabe ressaltar que os procedimentos médicos registrados no SPDATA cobrem, além de consultas, a totalidade dos atendimentos realizados por paciente, incluindo cirurgias decorrentes de urgências, emergências e agendadas (cirurgias eletivas), sendo, portanto, um registro quantitativo.

Já na PPM, o registro é feito para fins de faturamento e pagamento do profissional, sendo contabilizados à parte os valores das cirurgias eletivas e pequenos procedimentos. As cirurgias de urgência e emergência são cobertas pelos plantões.

Nos três meses considerados na amostra, o médico da GMS (MED4) recebeu pela sua produção o valor médio mensal de R$120.090,00. Já o médico (MED2) utilizado na comparação recebeu uma média mensal de R$33.588.83, conforme quadro abaixo.

Tabela 3 - Amostra comparativa de produção e ganhos de médicos do HMTF.

Fonte: Sistema de Gestão Hospitalar do HMTF-SPDATA, Planilha de Produção Médica-PPM do setor
de faturamento do hospital.



O médico identificado como MED2, especializado como Cirurgião Geral, foi um dos entrevistados durante os trabalhos de campo.

Questionado sobre a possibilidade de faturar com plantões, cirurgias eletivas e pequenos procedimentos um valor superior a 100.000,00 por mês, seguindo a tabela de enquadramento do hospital para remuneração, afirmou que não havia essa possibilidade por conta de esgotamento físico e indisponibilidade de leitos, insumos e equipamentos.

Afirmou, ainda, que em um dos meses que teve a maior produção, praticamente morando no hospital, recebeu aproximadamente R$ 40.000,00.

É destaque de nota o registro da produção médica do mês de novembro/18 do médico da GMS, já no encerramento do seu contrato. Neste mês, a PPM registrava a execução de apenas 17 cirurgias eletivas e, de forma não vista nos meses anteriores, a execução de 230 pequenos procedimentos.

O faturamento nesse mês foi de R$16.730,00, contudo, não se identificou processo de pagamento dessa produção. Nesta data não havia mais condições para enquadrar pequenos procedimentos como cirurgias e faturar dentro da conta de chegada de R$120.000,00 mensais.

Presume-se que uma das razões foi a veiculação nos meios de comunicação local de uma denúncia de superfaturamento nos contratos da GMS e uma fiscalização em andamento dos órgãos de controle.

Em 9/11/2018, o site local da cidade “Siga a Notícia” registrava como manchete que a “CGU apura suspeita de superfaturamento em contratos”, com conteúdo da matéria integralmente relacionado à GMS Assistência médica Ltda.

Assim, o levantamento inicial do SPDATA não serviu apenas para reforçar o direcionamento de atendimentos para o médico da GMS. A sua consolidação, ainda que pareça um número excessivo, pois foram 829 procedimentos médicos executados contra 230 do segundo cirurgião de maior produção, deve ser admitido como verdadeiro, pela fidelidade do sistema.

Foi útil para revelar com maior precisão o superfaturamento por cirurgias não realizadas quando cruzado com o faturamento da PPM durante todo o período de vigência do contrato, com a tabela a seguir demonstrando seu cálculo consolidado

Tabela 4 - Superfaturamento procedimentos cirúrgicos - GMS Clínica Médica Ltda.

Fonte: SPDATA, Planilhas de Produção Médica-PPM


Ressalta-se que o SPDATA não classifica os procedimentos cirúrgicos por porte. Isso é feito pela tabela de enquadramento utilizada pelo setor de faturamento do hospital.

A classificação adotada pelo hospital remunera as cirurgias eletivas I entre R$ 150,00 e R$ 250,00, as cirurgias eletivas II entre R$ 300,00 e R$ 600,00, com exceção do CPRE que é tabelado em R$ 5.000,00. Como observado, os valores atribuídos aos procedimentos da GMS variaram entre R$ 250,00 e R$ 400,00.

Como este enquadramento não está presente no SPDATA, a CGU adotou no cálculo uma postura conservadora. Atribuiu primeiro os procedimentos de maior valor presentes na PPM como executados pelo médico para em seguida chegar aos procedimentos de menor valor.

Por exemplo, dos 156 procedimentos de cirurgias oncológicas, a mais cara entre elas, a PPM apresentou 156 cirurgias realizadas e todas foram consideradas como realizadas, de modo que na coluna de superfaturamento o valor atribuído foi zero, embora não tenha sido feito uma verificação no SPDATA para confirmar se dos 821 procedimentos executados pelo médico da GMS o número registrado se refere, de fato, a cirurgias oncológicas.

Caso houvesse o esforço dessa classificação, por óbvio, não se encontraria mais de 156 procedimentos que pudessem ser classificados como oncológicos, sendo mais provável encontrar número inferior que pudesse ser enquadrado nessa categoria, com o valor de superfaturamento tendendo a crescer. O mesmo raciocínio vale para cirurgias eletivas II com maior absorção entre os procedimentos do SPDATA com essa classificação.

Um levantamento dos dez maiores procedimentos acima de vinte execuções apresentado no quadro a seguir é esclarecedor nesse sentido.

Tabela 5 - Número de procedimentos - GMS no período de nov./2017 a out./2018.

Fonte: SPDATA

Esse levantamento foi útil para mais um exame de regularidade dos procedimentos com maior número de realizações quando comparados a uma série histórica entre meses de anos diferentes.

Assim a CGU solicitou os mesmos dados acima do SPDATA referentes aos meses de setembro e outubro de 2019 e consolidou os três primeiros procedimentos com maior número de realizações observados em 2018.

O novo cruzamento teve por objetivo verificar se, após a saída do médico da GMS, os três procedimentos mais executados em 2018 apresentaram redução em 2019, reforçando a afirmação de criação de demanda evidenciada nas entrevistas e nos cálculos mencionados.

O resultado da análise reforçou essa afirmação, embora a análise tenha se limitado a apenas dois meses, não deixou de ser revelador.

No bimestre de 2018 (set/out), o procedimento 415040027 (Debridamento de Fasceite Necrotizante) foi realizado 31 vezes, sendo 19 deles realizados pelo médico da GMS, já no mesmo bimestre de 2019 foram apenas oito realizações.

O mesmo resultado se repetiu nos bimestres seguintes. Ou seja, uma redução considerável em 2019, sendo que em 2018 o maior número de procedimentos executados fora atribuído ao médico da GMS. O quadro a seguir completa a leitura das informações.

Tabela 6: Série Histórica de procedimentos médicos bimestre 2019/2018.

Fonte: SPDATA Legenda: DMF= Executado no bimestre pelo médico da GMS.

Finalizando, diante de todas as evidências e com base no que foi possível aferir, por meio de entrevistas e documentos, conclui-se que além do superfaturamento com plantões, houve também superfaturamento no pagamento de cirurgias e pequenos procedimentos à GMS de aproximadamente R$ 421.950,00, podendo esse valor ainda ser superior.


ANEXOS

I – MANIFESTAÇÃO DA UNIDADE EXAMINADA E ANÁLISE DA
EQUIPE DE AUDITORIA

Achado n. º 01

Por meio do Ofício nº 48, de 18/6/2020, da Procuradoria-Geral do Município de Teixeira de Freitas-BA, o gestor apresentou manifestação ao Relatório de Apuração Preliminar, a qual é a apresentada a seguir juntamente com a análise da equipe de auditoria:

Item 1. Irregularidades no processo de Chamamento Público para fins de Credenciamento de pessoas físicas ou jurídicas para prestação de serviços médicos especializados – subitens: 1.1 Processo de Inexigibilidade não trouxe a adequada justificativa para a contratação por meio do instituto do Credenciamento;

1.2 Diferenciação indevida entre pessoas físicas e jurídicas, afetando o princípio da igualdade para Credenciamento e; 

1.3 Não houve adoção de critérios e/ou metodologia de distribuição objetiva de demandas entre os credenciados.

Sem apresentação de argumentos específicos por item ou subitem às constatações apresentadas, o gestor informou que:

1) O município possui reduzido quadro de profissionais médicos, muito embora realize com frequência concursos públicos e processos seletivos, para diversas especialidades, conforme cópias de Editais anexas, mas ainda assim, encontramos dificuldade no preenchimento dos cargos, restando como melhor opção o credenciamento de Pessoas Físicas ou Jurídicas para a prestação de serviços médicos, seja porque são poucos os especialistas; não há adesão aos certames; ou, como ocorre na maioria dos Municípios de médio e pequeno porte, muito profissionais não querem vínculo com o Poder Público.

Todavia, as diversas considerações foram encaminhadas à Procuradoria e ao Departamento de Contratos para análise e aprimoramento, quando for o caso.

Análise da Equipe de Auditoria (Achado n. º 01).

As dificuldades apontadas pelo gestor no preenchimento dos cargos para prestação de serviços médicos não elidem as impropriedades apontadas no relatório que se referem às falhas nos procedimentos necessários à abertura, elaboração e prosseguimento de processo de Credenciamento para contratação de serviços médicos e de saúde, descumprindo aspectos da Lei 8666/1993 e legislação própria aplicada ao setor de saúde.

Por outro lado, observa-se que o próprio gestor reconhece as constatações e já considera a necessidade de encaminhamento desses achados internamente para a aprimoramento dos próximos processos de contratação, quando for o caso, razão pela qual mantém-se o registro original.

Achado n. º 02

Item 2. Pagamentos por serviços não prestados, resultando em superfaturamento de R$ 907.590,00 – subitens: 2.1 Superfaturamento por Plantões não realizados gera pagamento indevido de R$ 485.640,00 e; 2.2 Superfaturamento em cirurgias e pequenos procedimentos geram pagamento indevido de R$421.950,00.

Em relação aos itens e subitens anteriores acima, o gestor assim se manifestou:

2) No que concerne às conclusões preliminares da Auditoria CGU, relativa ao contrato de credenciamento supra mencionado, informamos a V. Sa. que, em razão de solicitação do DENASUS foi constituída Comissão de Auditoria através do Decreto nº 866/2018, cópia anexa, que emitiu o relatório preliminar anexo, e recentemente, por orientação da Procuradoria Jurídica, foram expedidas notificações à empresa e seu representante legal, para que tomem conhecimento do referido relatório e exerçam o direito de defesa, ou seja, o processo permanece em tramitação na Procuradoria Geral do Município, que tão logo concluído e constatado qualquer prejuízo ao Erário, adotará as medidas legais ao ressarcimento e eventual responsabilização administrativa.

No entanto, identificamos que há divergência na totalização dos relatórios preliminares, muito embora a Comissão Municipal tenha considerado todos os serviços lançados do primeiro ao último registro de atendimento, confrontados com prontuários e, eventualmente, pelo SPData, quanto o prontuário não era localizado.

Daí que, em relação a esta auditoria, aguarda-se o decurso dos prazos fixados para a defesa, para posterior adoção de medidas administrativas e/ou judiciais, para responsabilização dos agentes envolvidos e ressarcimentos ao Erário, como já dito acima.

 

Análise da Equipe de Auditoria (Achado n. º 02).

Cabe esclarecer que, no transcurso das fases de execução dos trabalhos da fiscalização e de elaboração do Relatório Preliminar , a equipe de auditoria da CGU não teve conhecimento da existência, muito menos o acesso à solicitação do Departamento Nacional de Auditoria do SUS – DENASUS citado pelo gestor, e nem tampouco aos Relatório Internos produzidos e/ou documentos e informações elaborados e/ou relacionados à Comissão de Auditoria constituída por meio do Decreto municipal nº 866/2018 citado. 

Observa-se que, durante os trabalhos de auditoria iniciados em novembro de 2019, foram solicitados e reiterados ao Gestor a disponibilização de todos os documentos relacionados ao Credenciamento 04/2017 e, também, os contratos decorrentes desse procedimento, por meio das Solicitações de Auditoria nº 01 a 04. Ressalta-se que os documentos foram solicitados expressamente, tais como, nos itens 12 e 13 da SA nº 04: Relatórios da Controladoria Geral do Município referentes aos Credenciamentos nº  04/2017 e 01/2018 e respectivos contratos e; Relatórios da Auditoria do DENASUS realizada no Hospital Municipal de Teixeira de Freitas.

Nessas solicitações de documentos e informações para formação da opinião dos auditores, os prazos fixados para atendimento das Solicitações de Auditoria foram sempre razoáveis e, na maioria das vezes, dilatados por até 3 meses, considerando as demandas por prorrogação do gestor, sempre motivadas por dificuldades na localização dos processos e escaneamento dos documentos.

Além desses fatos, ressalta-se que, durante os trabalhos de campo, foram realizadas diversas entrevistas com os responsáveis designados pela Prefeitura como interlocutores e, ainda efetivados diversos contatos telefônicos e por e-mail, mesmo após retorno da equipe das atividades de campo. Sempre se enfatizou a necessidade de disponibilização de todos os documentos e/ou eventual justificativa da sua não entrega, se fosse o caso.

Mesmo diante de toda essa clara sistemática para permitir o amplo acesso da equipe aos documentos relacionados ao objeto da auditoria, não ocorreu em nenhum momento a citação pelo gestor da existência desses documentos e processos internos, nos surpreendendo o seu encaminhamento somente agora, junto à manifestação do gestor, os quais são relacionados a apuração de desvios em contratos efetivados em face do Credenciamento 04/2017.

Salienta-se, ainda, que a servidora que assinou o Relatório Conclusivo da Auditoria Interna do município e foi a presidenta da referida Comissão, atuou também como interlocutora da Prefeitura junto à CGU, sendo a principal responsável pelos contatos com a equipe de fiscalização durante e após o encerramento dos trabalhos de execução de auditoria, não podendo alegar desconhecimento das nossas solicitações e dos documentos que somente após a emissão do Relatório Preliminar foram apresentados.

Pela análise da manifestação e das datas dos documentos apresentados, por meio desse Ofício nº 48, de 18/6/2020, da Procuradoria-Geral do Município de Teixeira de FreitasBA, verifica-se que tais informações, documentos e procedimentos administrativos já se encontravam prontos e/ou em estágio avançado, anteriormente aos trabalhos de campo da auditoria, os quais, reforçamos, se iniciaram em novembro de 2019.

Diante desses fatos, entende-se que o gestor, ao não entregar tais documentos e informações no curso da auditoria, sem juízo de valor sobre a motivação, descumpriu o art. 26 da lei 10.180, incorrendo em sonegação de “processo, documento ou informação”, conforme transcrição da lei abaixo.

Art. 26. Nenhum processo, documento ou informação poderá ser sonegado aos servidores dos Sistemas de Contabilidade Federal e de Controle Interno do Poder Executivo Federal, no exercício das atribuições inerentes às atividades de registros contábeis, de auditoria, fiscalização e avaliação de gestão.

§ 1o O agente público que, por ação ou omissão, causar embaraço, constrangimento ou obstáculo à atuação dos Sistemas de Contabilidade  Federal e de Controle Interno, no desempenho de suas funções institucionais, ficará sujeito à pena de responsabilidade administrativa, civil e penal.

§ 2o Quando a documentação ou informação prevista neste artigo envolver assuntos de caráter sigiloso, deverá ser dispensado tratamento especial de acordo com o estabelecido em regulamento próprio. 

§ 3º O servidor deverá guardar sigilo sobre dados e informações pertinentes aos assuntos a que tiver acesso em decorrência do exercício de suas funções, utilizando-os, exclusivamente, para a elaboração de pareceres e relatórios destinados à autoridade competente, sob pena de responsabilidade administrativa, civil e penal.

Apesar desses fatos, observa-se com a revelação do conteúdo dos documentos apresentados e da manifestação do gestor por meio do Ofício nº 48, de 18/6/2020, que o Relatório Conclusivo da Auditoria Interna realizada pela comissão criada na Prefeitura também apontou para os mesmos fatos de irregularidades graves com recursos do SUS de pagamentos por serviços não prestados, resultando assim em superfaturamento.

Todos esses fatos demonstram que, desde os primeiros momentos que a Auditoria da CGU se iniciou o gestor tinha o pleno conhecimento dos fatos apontados, contudo sem dar a devida ciência à equipe de fiscalização. No entanto, observa-se que o montante de pagamentos irregulares de R$ 635.430,00 encontrados pela Comissão constituída pelo gestor diverge do valor levantado pela equipe da CGU que foi R$ 907.590,00.

Tal diferença é apontada na manifestação do gestor como decorrente de a Comissão Municipal ter “considerado todos os serviços lançados do primeiro ao último registro de atendimento, confrontados com prontuários e, eventualmente, pelo SPData, quanto o prontuário não era localizado.

 

Sem entrar no mérito da legitimidade dos cálculos/levantamentos apresentados pelo gestor, conclui-se pela necessidade de uma avaliação detalhada dos valores, o que poderá ser feito pela instauração de tomada de contas especial visando a apuração do débito e dos responsáveis, com acesso amplo às evidências e aos prontuários.

O objetivo principal seria determinar a correta classificação dos tipos de procedimentos e o efetivo valor final de pagamentos efetuados por serviços não prestados pelo município com recursos do SUS. A partir desses valores, efetuar as necessárias providências de glosas/ressarcimento junto aos respectivos responsáveis, sem prejuízo dos demais encaminhamentos não só pelos fatos que guardem relação com os pagamentos por serviços não realizados, o Superfaturamento, mas também pelos atos e omissões que permitiram esse conjunto de irregularidades.

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